ACÓRDÃO
Acorda, em Turma, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador Francisco Kupidlowski, incorporando neste o Relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento.
Belo Horizonte, 25 de março de 2010
Alberto Henrique
Relator
RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Alberto Henrique: trata-se de Recurso de Apelação interposto contra a r. sentença de fls. 206/211, proferida nos Autos de Evicção c.c. Reparação por Danos Materiais e Morais proposta por J. M. S. G. em face de J. R. S.
Na sentença, o MM. Juiz julgou parcialmente procedente o pedido inicial para condenar o réu a ressarcir ao autor o valor pago na aquisição do veículo à época do contrato celebrado, a saber, R$ 33.000,00, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios, desde a citação.
Inconformado, insurge o réu contra o decisum.
Em suas razões, discorre sobre a evicção e diz que o seu reconhecimento por via administrativa requer o implemento de determinadas condições.
Afirma que a alegação de que o veículo é adulterado não pode dar azo ao reconhecimento do instituto, por não se tratar de ato que possa ser caracterizado como inequívoco da autoridade de trânsito ou mesmo policial, de modo que não pode substituir sentença judicial nem se equivaler a ela.
Diz que o apelado não juntou aos Autos nenhum laudo conclusivo acerca da referida irregularidade.
Aduz que não é competência do órgão de trânsito aferir sobre a procedência lícita ou ilícita de veículos, mas apenas de documentação e política de trânsito.
Informa que, quando da vistoria, foi instaurado procedimento administrativo para a verificação da suposta irregularidade, e o apelado não juntou aos Autos o deslinde de tal procedimento.
Assim, alega que o apelado não provou que o veículo foi adulterado, motivo pelo qual o pedido deve ser julgado improcedente.
Em atenção ao Princípio da Eventualidade, requer que os juros remuneratórios incidam a partir da publicação da sentença e não da citação.
Contrarrazões a fls. 235/240.
É o relatório.
VOTO
Constatada a presença dos pressupostos de admissibilidade, conheço do Recurso.
O âmago da presente Ação diz respeito à responsabilidade do apelante em razão de venda de veículo ao apelado que, posteriormente à celebração do negócio, foi apreendido por autoridade policial em razão de adulteração do chassi.
Ao buscar o Registro da alienação do veículo junto ao órgão estadual competente, o apelado foi surpreendido com a apreensão do automóvel em virtude da adulteração do chassi.
Com efeito, o art. 1.107 do antigo CC (atual art. 447) lecionava: “Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção”.
No caso dos Autos, o apelante não nega que tenha vendido o veículo ao apelado e também restou demonstrada nos Autos a remarcação do veículo, consoante laudo de vistoria do Detran, acostado a fls. 42.
A responsabilidade do réu é inconteste e fora de dúvidas. Vendeu o veículo pela importância de R$ 35.000,00, o qual foi apreendido pela autoridade policial por adulteração do chassi.
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Desse modo, o prejuízo experimentado pelo autor deve ser ressarcido pelo vendedor, independentemente da averiguação de culpa.
Acerca da matéria, leciona a doutrina:
“A responsabilidade por evicção incide, em princípio, sobre os contratos onerosos comutativos, dado que lhes é essencial a equivalência entre as prestações recíprocas. Com a evicção, quebra-se tal equivalência. Todo o regime de indenização a que vai dar lugar a responsabilidade por evicção tem em vista restaurar esse equilíbrio rompido” (TEPEDINO, GUSTAVO, et al. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República, v. 2, Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 73).
Ao contrário do que defende o apelante, deve-se assentar que o direito à evicção não está restrito ao desapossamento decorrente de decisão judicial, mas também em consequência de ato de autoridade policial ou administrativa.
A respeito do tema, ARNALDO RIZZARDO lembra que: “o adquirente de veículo furtado, posteriormente apreendido por ordem de autoridade policial, pode ajuizar ação de indenização fundada na evicção contra o vendedor, pois a apreensão policial equipara-se em tudo aos meios judiciais” (RIZZARDO, ARNALDO. Contratos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 180).
E acrescenta, transcrevendo Acórdão do Tribunal de Alçada de São Paulo, publicado na Revista dos Tribunais nº 732, p. 245, que: “o sentido exato da palavra evicção é muito mais amplo do que lhe foi dado por POTHIER, eis que abrange todos os casos em que o adquirente, mesmo sem demanda judicial, não pode conservar a coisa adquirida, ou somente a conserva em consequência de um direito ao título de aquisição (cf. CUNHA GONÇALVES. Tratado de Direito Civil, vol. VII/19, tomo I, idem CARVALHO SANTOS, Código Civil Brasileiro Interpretado, 15/379; e MARIA HELENA DINIZ, Curso de Direito Civil Brasileiro, Saraiva, 1984, III/102)” (Idem, Ibidem, p. 181).
No mesmo sentido, a jurisprudência:
“Ementa: Evicção. Indenização. Alienação de veículo furtado. Desnecessidade de sentença judicial. Tem adquirente direito à indenização decorrente da evicção, independentemente de sentença judicial, desde que privado do bem por ato de autoridade policial ou administrativa. Apelação desprovida” (7 fls.) (ACi nº 70000223347; 9ª Câm. Cível; TJRS; Rel. Rejane Maria Dias de Castro Bins; j. 3/11/1999).
“Evicção. Ato administrativo. Apreensão policial. Veículo furtado. Responsabilidade do fornecedor. 1 - O comprador que perde o bem por ato administrativo da autoridade policial, na busca e apreensão de veículo furtado, pode promover ação de indenização contra o vendedor. Art. 1.117 do CC. Precedentes. Art. 18 do CDC. Recurso conhecido e provido” (REsp nº 162.163-SP; Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar; T4 - 4ª T.; j. 16/4/1998; DJ de 29/6/1998; p. 214).
A adulteração do veículo foi comprovada, bem como a sua impossibilidade de transferência para o autor, mostrando-se desnecessária a juntada do desfecho do procedimento administrativo instaurado, como afirmado pelo apelante.
Nesse sentido, em caso análogo já se posicionou este Tribunal:
“Ementa: Ação de Indenização. Evicção. Compra e venda de veículo furtado. Chassi adulterado. Responsabilidade do vendedor. Sendo a evicção uma garantia que se dá contra defeitos de direito da coisa, obrigando o alienante a garantir a legitimidade do direito que transfere, tendo o veículo alienado sido produto de furto, verifica-se a ocorrência da evicção (perda da coisa adquirida), restando ao alienante o dever de indenizar o adquirente pelos prejuízos sofridos” (ACi nº 2.0000.00.512677-2/000; Rel. Des. José Afonso da Costa Cortes).
Nessas circunstâncias, diante da inadmissibilidade do registro e consequente apreensão do veículo pela autoridade policial, impõe a responsabilização do alienante do veículo em face da evicção, motivo pelo qual nenhum reparo merece a decisão fustigada.
Do mesmo modo, não merece acolhida a pretensão de que os juros de mora incidam a partir da publicação do acórdão, já que não se trata da hipótese de fixação de indenização por danos morais, devendo incidir a partir da citação, como corretamente fixado na sentença.
Com efeito, em caso de devolução de valor em decorrência da evicção, esta deve ser cabal, incluindo-se os juros desde a citação, pois a partir daí passou o devedor a incorrer em mora.
Com tais razões de decidir, nego provimento ao Recurso, mantendo incólume a sentença.
Custas recursais pelo apelante, suspensa a exigibilidade em virtude da concessão da Assistência Judiciária.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores: Luiz Carlos Gomes da Mata e Francisco Kupidlowski.
Súmula: negaram provimento.
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