RELATÓRIO
Pela r. sentença de fls. 105/109, cujo relatório adoto e a este incorporo, a Juíza Fabiana Alves Marra, da 36ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte-MG, rejeitou a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido e julgou improcedentes os pedidos formulados na Inicial.
O sindicato-autor interpôs Recurso Ordinário, a fls. 110/117, versando sobre contratação de aprendizes e base de cálculo do art. 429 da CLT.
Contrarrazões a fls. 135-136.
Parecer do Ministério Público do Trabalho, a fls. 139/142, opinando pelo conhecimento e desprovimento do Apelo.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
Conheço do Recurso Ordinário e das contrarrazões, porquanto cumpridas as formalidades legais. Conheço do documento de fls. 118-119, porque se refere a mera cópia de sentença proferida nos Autos do Processo nº 00388-2010-001-03-00-9. Todavia, não conheço dos documentos de fls. 120/127, pois não se referem a fato posterior à sentença e tampouco foi comprovado o justo impedimento para a sua oportuna apresentação. Inteligência da Súmula nº 8 do TST.
Juízo de Mérito
Obrigação de fazer. Contratação de aprendizes. Art. 429 da CLT.
O ato administrativo é dotado, dentre outros, do atributo da presunção relativa de legitimidade e de veracidade. Assim, salvo prova em contrário da parte interessada, o ato administrativo é considerado válido em razão da submissão ao Princípio da Legalidade.
Por outro lado, o art. 428 da CLT preceitua que:
“Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 e menor de 18 anos, inscrito em programa de aprendizagem, formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar, com zelo e diligência, as tarefas necessárias a essa formação.
(...)
§ 4º - A formação técnico-profissional a que se refere o caput deste artigo caracteriza-se por suas atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho”.
Como se vê, o objeto da contratação é a formação profissional do menor, sendo certo que o legislador teve por escopo exigir que a empresa se comprometa a oferecer ao aprendiz conhecimentos técnico-profissionais para que ele, futuramente, possa se inserir no mercado de trabalho.
A contratação de aprendizes constitui imposição legal, conforme previsto no art. 429 da CLT, in verbis:
“Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional”. Idêntica determinação consta no art. 9º do Decreto nº 5.598/2005, que regulamenta a contratação de aprendizes.
Dessa maneira, importa definir quais as funções que demandam formação profissional e que servem de base de cálculo para o preenchimento da quota de aprendizes pela empresa.
O mencionado Decreto procura definir a questão ao estabelecer no art. 10 que o aprendiz deva desempenhar funções que requeiram formação profissional, considerando a Classificação Brasileira de Ocupações - CBO -, elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, ficando excluídas as funções que exigem formação técnica ou superior e os cargos de direção, gerência ou de confiança. O § 2º do art. 10 do referido Decreto determina a inclusão na base de cálculo de todas as funções que exijam formação profissional, independentemente de serem proibidas para menores de 18 anos.
Portanto, inexiste proibição de se contratar aprendiz na atividade-fim da empresa. Logo, havendo necessidade de conhecimento técnico específico, a função se afigura incompatível com o contrato de aprendizagem, que tem o aprendizado como um de seus objetivos, conjugando atividades teóricas e práticas.
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Com a majoração da faixa etária dos aprendizes para até 24 anos (art. 428 da CLT), tornou-se irrelevante o argumento acerca da impossibilidade de contratação de aprendizes menores para a função insalubre, perigosa ou noturna, eis que a empresa poderá contratá-los, desde que habilitados, com idade compreendida entre 18 e 24 anos, para fins de preenchimento da cota do art. 429 da CLT. Frise-se que não há nenhuma vedação constitucional ao exercício de qualquer atividade aos aprendizes com idade entre 18 e 24 anos, de conformidade com o art. 7º, inciso XXXIII, da CR. Tanto assim, aliás, que o art. 11 do Decreto nº 5.598/2005 é claro, no sentido de que:
“A contratação de aprendizes deverá atender, prioritariamente, aos adolescentes entre 14 e 18 anos, exceto quando:
I - as atividades práticas da aprendizagem ocorrerem no interior do estabelecimento, sujeitando os aprendizes à insalubridade ou à periculosidade, sem que se possa elidir o risco ou realizá-las integralmente em ambiente simulado;
II - a lei exigir, para o desempenho das atividades práticas, licença ou autorização vedada para pessoa com idade inferior a 18 anos; e
III - a natureza das atividades práticas for incompatível com o desenvolvimento físico, psicológico e moral dos adolescentes aprendizes.
Parágrafo único - A aprendizagem para as atividades relacionadas nos incisos deste artigo deverá ser ministrada para jovens de 18 a 24 anos“.
Pelo exposto, é possível concluir que, para saber quantas vagas a empresa deve abrir para os aprendizes, o primeiro passo é verificar quais os cargos de que a empresa dispõe; a seguir, cabe identificar as atividades sujeitas à aprendizagem e, a partir daí, calcular a cota. Isso significa que o percentual de 5% a 15% não deve ser aplicado sobre o total dos empregados, mas sobre o total das funções que demandem formação profissional. Para saber quais são essas funções, deve ser considerada a Classificação Brasileira de Ocupações - CBO. A partir disso, podem ser apontadas as funções e elaborados os cálculos de quantos devem ser contratados. Saliente-se que a listagem oferecida pela CBO trata de funções que não demandam habilitação profissional de nível técnico ou superior, mas que não excluem, por si só, a necessidade de formação profissional.
Assim, como ressaltado pelo Juízo a quo a fls. 107, que: “(...) as funções exercidas por grande parte dos empregados das empresas substituídas, além de se encontrarem previstas na Classificação Brasileira de Ocupações (fls. 98-99), demandam formação profissional (fls. 100), razão pela qual não podem ser excluídas da ‘base de cálculo’ do número de aprendizes”.
Além do mais, consigna a Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Execução) que a formação profissional versada no art. 429 da CLT abrange, também, a formação inicial e continuada.
Assim, as funções a que se refere o autor devem ser incluídas na cota de aprendizes, porquanto são os profissionais que a lei visa beneficiar, mesmo porque é inegável que eles são os que mais sofreram em decorrência do deficit no processo de escolarização.
Ademais, a lei não estabelece relação direta entre as funções existentes na empresa e a contratação de aprendizes para todas elas, mas apenas prevê o preenchimento de determinado percentual sobre o total de empregados.
Constata-se, deste modo, que o entendimento adotado em nada contraria o disposto na Portaria nº 2.185/2009 do Ministério do Trabalho e Emprego.
A despeito de ser oriundo de brilhante lavra o posicionamento em contrário citado no Apelo, o Acórdão não pode ser alterado apenas com fulcro em entendimento consignado em outros processos, estando o Juiz livre para julgar de acordo com seu próprio convencimento.
No caso, o autor não logrou infirmar a presunção relativa de certeza, liquidez e exigibilidade que o ato administrativo encerra. Também deixou de colacionar aos Autos a relação das funções exercidas pelos empregados das empresas substituídas com as respectivas CBOs (Classificação Brasileira de Ocupações) e o número de trabalhadores nas correspondentes funções, documentos utilizados como parâmetro para a fixação da quota de aprendizes.
Conclui-se, então, à míngua de prova contrária, que nem todos os empregados das substituídas estavam vinculados às funções que as isentam da obrigação de contratar imposta, nos termos do art. 10, § 1º, do Decreto nº 5.598/2005.
Nada a prover.
Fundamentos pelos quais,
O TRT-3ª Região, pela sua 10ª Turma, à unanimidade, conheceu do Recurso Ordinário e das contrarrazões, mas não conheceu dos documentos de fls. 120/127; no mérito, sem divergência, negou provimento ao Apelo.
Belo Horizonte, 4 de outubro de 2010
Deoclecia Amorelli Dias
Relatora
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