DIREITO PENAL
Estelionato - Privilégio - Requisitos presentes - Reconhecimento - Prescrição - Os requisitos para a concessão do privilégio previsto no § 1º do art. 171 do CP são: o pequeno prejuízo e a primariedade do agente. O não reconhecimento do benefício referido, presume-se, está justificado no fato de o recorrente responder a processo e ter condenação. Contudo, não é possível negá-lo quando o interessado, embora primário, registra algum tipo de antecedente ou circunstância pessoal negativa. Sendo o Direito Penal um Direito de tipos, devem-se verificar quais são os elementos no tipo previsto naquele dispositivo penal. Se presentes, só cabe ao Juiz optar por uma das hipóteses previstas no artigo da lei. Não pode é ampliar em desfavor do condenado o seu sentido, ver em seu texto condições, exigências ou pressupostos ali não mencionados. Aqui, estão presentes os requisitos para o reconhecimento do Estelionato Privilegiado. Redução de pena que leva à declaração da extinção da Ação Penal pela prescrição da pretensão punitiva. Decisão: Apelo defensivo parcialmente provido. Declaração da prescrição. Unânime (TJRS - 7ª Câm. Criminal; ACr nº 70037777927-Nova Prata-RS; Rel. Des. Sylvio Baptista Neto; j. 21/10/2010; v.u.). |
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ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os Autos, Acordam os Desembargadores integrantes da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao Apelo defensivo, para, reconhecendo o Estelionato Privilegiado, reduzir a pena de reclusão para 8 meses. De ofício, julgaram extinta a Ação Penal pela prescrição da pretensão punitiva, na forma dos arts. 107, inciso IV, 109, inciso VI, 110, §§ 1º e 2º, e 114, todos do CP. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os Ems. Srs. Desembargadores Naele Ochoa Piazzeta e João Batista Marques Tovo. Porto Alegre, 21 de outubro de 2010 Sylvio Baptista Neto Relator RELATÓRIO Desembargador Sylvio Baptista Neto (Relator): 1 - C. C. C. foi denunciado como incurso nas sanções do art. 171, caput, do CP (Denúncia recebida em 23/6/2008), e, após o trâmite do procedimento, condenado às penas de 2 anos de reclusão, substituída, e 30 dias-multa. Descreveu a peça acusatória que, no ano/2006, o denunciado obteve vantagem ilícita mediante meio ardil, prejudicando o A. F. Induziu em erro seu proprietário, ao pagar por mercadorias com uma falsa afirmação. O valor foi de R$ 58,00. Inconformada com a decisão, a Defesa apelou. Em suas razões, o Defensor postulou a absolvição do recorrente, alegando que a prova coligida aos Autos era insuficiente. Em contrarrazões, o Promotor de Justiça manifestou-se pela manutenção da sentença condenatória. Nesta Instância, em Parecer escrito, a Procuradora de Justiça opinou pelo desprovimento do Recurso. VOTO Desembargador Sylvio Baptista Neto (Relator): 2 - Penso que não há necessidade de adentrar no mérito da causa para afirmar que a Ação Penal está extinta. No caso, pela prescrição da pena aplicada. Isso porque, o que não foi reconhecido na sentença, deve-se aplicar em favor do apelante o benefício do Estelionato Privilegiado. Lá, na decisão, nada foi referido e presumo que o não reconhecimento do benefício esteve ligado aos antecedentes do recorrente. Porém, os 2 requisitos exigidos pelo § 1º do art. 171 do CP: a primariedade do agente e o pequeno prejuízo. Penso, repetindo, que não é possível negar o privilégio quando o interessado, embora primário, registra algum tipo de antecedente ou circunstância pessoal negativa. E as razões são as seguintes: “O Direito Penal é um Direito de tipos. Importa, portanto, verificar quais são os essentialia do tipo previsto no § 2º do art. 155: primariedade do agente e pequeno valor da coisa. Existentes estes, não cabe ao Juiz mais do que - aí sim, exercitando verdadeiro poder discricionário - optar pela pena de detenção, diminuída de 1 a 2/3, ou pela multa. O que não pode é ampliar em desfavor do réu o sentido da lei, ver em seu texto condições, exigências ou pressupostos aí não mencionados e que, por isso mesmo, não podem ser exigidos. A só presunção de que este seria o pensamento do legislador, com ser temerária, não justifica que, sem norma expressa, se complete ou modifique a figura típica aí mencionada, em detrimento de uma das garantias mais expressivas do Direito Penal, que é a da legalidade dos delitos e das penas” (WEBER MARTINS BATISTA, O Furto e o Roubo no Direito e no Processo Penal, Forense, 1987, p. 72). |
“ROGER MERLE e ANDRÉ VITU (Traité de droit criminel, p. 198) tecem interessantes observações sobre a repercussão do Princípio da Legalidade no que tange ao Juiz Criminal, enfatizando, em especial, que tal princípio lhe impõe uma interpretação não extensiva. ‘Seria inútil que o legislador estabelecesse incriminações precisas se, por uma interpretação arbitrária ou analógica, os Juízes pudessem dar aos textos penais o alcance que lhes parecesse desejável: a incerteza seria semelhante, para os acusados, à que adviesse de uma completa ausência de textos legislativos’. Exemplo significativo desta interpretação ampliativa, no Direito Penal brasileiro, pode ser detectado na corrente jurisprudencial que, no exame do § 2º do art. 155 do CP, substituiu requisitos puramente objetivos estabelecidos pelo legislador (primariedade e pequeno valor da coisa furtada) por dados de conotação subjetiva (bons antecedentes do acusado), de forma a transformar um direito do réu, se presentes as exigências legais, numa faculdade do Juiz, que poderá ou não, a seu talante, conceder o benefício legal” (ALBERTO SILVA FRANCO, Temas de Direito Penal, Saraiva, 1986, p. 2). “Ao facultar ao Juiz a admissão do Furto Privilegiado, submeteu a lei à concessão do benefício e, pois, o exercício da faculdade à satisfação de 2 únicos requisitos de natureza objetiva, concernentes à primariedade do agente e ao pequeno valor da res furtiva. Circunstâncias outras, ainda que passíveis de consideração na aplicação da pena, não constituem requisitos capazes, por si, de comprometer o benefício e de afastar a legitimidade de seu deferimento, se presentes os pressupostos a que, de forma exaustiva, alude a lei penal” (Lex nº 90/389). “Negar o apenamento privilegiado à conta de maus antecedentes do acusado (ainda que comprovados) equivalerá a inserir na lei penal, a dano do réu, condição por ela não prevista, solução por certo intolerável. Esses maus antecedentes influirão na dosimetria da pena, vale dizer, na adoção de um ou mais critérios previstos na norma” (Lex nº 91/395). Portanto, insistindo, é possível reconhecer o Furto Privilegiado, previsto no § 1º do art. 171 do CP. E dentre as possibilidades previstas na lei, a única plausível é a redução da pena privativa de liberdade, o que faço na maior fração, tendo em vista o valor do prejuízo e o Salário Mínimo da época. A pena de reclusão, então, é estabelecida em 8 meses. A punição referida no parágrafo anterior e a multa prescrevem em 2 anos. E esse lapso temporal já transcorreu entre as datas do fato e do recebimento da Denúncia. Essa foi recebida em 23/6/2008, e a 1ª é contada a partir de 1º/1/2006, tendo em vista o posicionamento da jurisprudência quando, como ocorre aqui, não existe uma data certa do crime: “Em tema de prescrição, não conhecida exatamente a data da prática da infração penal, deve adotar-se solução que não prejudique o réu (RJDTACRIM nº 25/104). Em sede de prescrição, conhecido o ano, mas ignorados data e mês da consumação do delito, deve ser considerado o dia 1º de janeiro como termo inicial para a fluência do prazo prescricional, por ser mais favorável ao réu, se o dia 1º de julho, marco da metade do ano, prejudicá-lo” (RJTACRIM nº 38/261). Deve ser computado a favor do réu o período liberatório da prescrição se indeterminado o dia do cometimento do crime, ao mencionar-se tão somente mês e ano, até a subsequente e propícia causa interruptiva (RT nº 611/381). Ignorados o dia e o mês da consumação do crime, mas conhecido o ano, razoável adotar como termo inicial da prescrição o dia 1º de julho, que marca a metade deste, salvo se a data prejudicar o réu, caso em que a solução ainda mais favorável deve ser preferida, estabelecendo-se no dia 1º de janeiro o início da fluência do prazo prescricional (RT nº 608/853)” (in Código Penal Interpretado, Atlas, 4. ed., p. 734). 3 - Assim, nos termos supra, dou parcial provimento ao Apelo Defensivo, para, reconhecendo o Estelionato Privilegiado, reduzir a pena de reclusão para 8 meses. De ofício, julgo extinta a Ação Penal pela prescrição da pretensão punitiva, na forma dos arts. 107, inciso IV, 109, inciso VI, 110, §§ 1º e 2º, e 114, todos do CP. Desembargadora Naele Ochoa Piazzeta (Revisora): de acordo com o Relator. Desembargador João Batista Marques Tovo: de acordo com o Relator. Desembargador Sylvio Baptista Neto (Presidente): Apelação Crime nº 70037777927, Comarca de Nova Prata: “À unanimidade, deram parcial provimento ao Apelo defensivo. De ofício, julgaram extinta a Ação Penal pela prescrição da pretensão punitiva, na forma dos arts. 107, inciso IV, 109, inciso VI, 110, §§ 1º e 2º, e 114, todos do CP”. Julgador de 1º Grau: Carlos Koester. |