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Jurisprudências

Direito Comercial

DIREITO COMERCIAL

Recurso Especial - Comercial e Processual Civil - Execução - Nota promissória assinada - Datas de vencimento - Uma por escrito e outra numérica - Divergência de entendimento - Nulidade - Aplicação de analogia - Incabível - Existência de lei expressa - Recurso Especial conhecido e provido - 1 - Existindo dispositivo legal que prevê expressamente a nulidade da nota promissória que apresenta divergência de data de vencimento, incabível torna-se a aplicação da analogia para suprir lacuna que não existe. 2 - Aplicação do art. 55, parágrafo único, da Lei nº 2.044/1908. 3 - Recurso Especial conhecido e provido (STJ - 4ª T.; REsp nº 751.878-MG; Rel. Min. Aldir Passarinho Junior; j. 20/4/2010; v.u.).

 

 

 

  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes Autos,

Decide a 4ª Turma, por unanimidade, conhecer do Recurso Especial e dar-lhe provimento, nos termos do Voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão e Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJAP) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 20 de abril de 2010

Aldir Passarinho Junior

Relator

  RELATÓRIO

Exmo. Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: adoto o Relatório da sentença de 1º Grau, a fls. 26:

“G. C. N. movimentou Ação de Execução de Título Extrajudicial em face de M. A. R. C., através de Inicial de fls. 02/04, alegando que o exequente é beneficiário de uma Nota Promissória emitida em 15/7/2000, vencida em 15/8/2000 e não resgatada pela executada, no valor de R$ 2.978,00, constituindo a cambial título executivo extrajudicial, conforme preceitua o art. 585, inciso I, do CPC. Requereu a citação para pagamento do débito atua-lizado em 24 horas ou nomear bens a penhora. A Inicial veio acompanhada de documentos de fls. 05/10.

Devidamente citada, a executada apresentou Exceção de Pré-Executividade argumentando a prescrição do direito de execução da Nota Promissória, uma vez que seu vencimento ocorreu em 15/8/1999, portanto, há mais de 3 anos, e que foi o título preenchido posteriormente e maliciosamente inseridos nesse novos números, objetivando aumentar o valor original. Arguiu, ainda, o disposto no art. 338, inciso II, do CPC, considerando a má- fé do preenchimento do título. Termina por requerer a desconstituição da exequibilidade da Nota Promissória e extinção da presente Execução; nomeia, ainda, bens a penhora, caso não seja este o entendimento.

É o relatório do necessário.

Afirma o exequente, na Inicial, que a Nota Promissória, da qual seria beneficiário, venceu em 15/8/2000. Entretanto, em melhor análise à cópia do título constante de fls. 07, observa-se que tem essa seu vencimento para 15/8/1999. Por outro lado, sua emissão está datada de 15/7/2000.

Certo é que é inadmissível que seja o título emitido após seu vencimento. Presente, assim, grave erro no preenchimento da Nota Promissória que enseja a presente Execução, retirando desta sua exequibilidade e admissibilidade, posto que vencimento é requisito de validade. Não há como considerar vencida uma obrigação cambial antes mesmo da emissão do título que a representa.

Não atende os requisitos necessários à regular Execução de acordo com o que preceitua o art. 586 do CPC. Assim sendo, é a Nota Promissória inexequível, dada a sua nulidade absoluta, posto não apresentar os requisitos formais exigíveis para sua formação.

Assim, acolho a Execução de Pré-Executividade oposta em 13/15, para extinguir a Execução, nos termos do art. 618, inciso I, do CPC. Custas pelo exequente, que ainda fica responsável pelo pagamento de honorários advocatícios de 20% sobre o valor da Execução. Suspendo, entretanto, a exigibilidade dessas parcelas porque defiro Justiça Gratuita”.

A sentença acolheu a Exceção de Pré-Executividade para extinguir a Execução, com base no art. 618, inciso I, do CPC.

Restou expresso no Acórdão recorrido, no Voto do Relator vencido no julgado, que, “observando-se o título de crédito ‘xerocopiado’ para fls. 7 dos Autos, nota-se que o mesmo foi programado para vencer em 15/8/1999 (preenchimento à mão) e, depois, com utilização de máquina, outro surgiu para 15/8/2000, estabelecendo-se a confusão” (fls. 50).

O Acórdão que julgou a Apelação Cível apresentada pelo recorrido recebeu a seguinte ementa (fls. 48):

“Execução. Exceção de Pré-Executividade. Improcedência. Nota Promissória com 2 datas de vencimento. Prevalência da data lançada por extenso. Provimento. (voto vencido)

De acordo com o art. 6º da Lei Uniforme de Genebra, a que o Brasil aderiu através do Decreto nº 57.663/1966, na nota promissória com datas diversas de vencimento, prevalece a data lançada por extenso, mantendo-se, assim, sua força executiva.

Provimento para prosseguimento da Execução.

V.v.: Execução. Exceção de Pré-Executividade. Procedência. Título e Execução anulados. Nota Promissória com 2 datas para vencimento. Nulidade confirmada. Recurso do exequente a que se nega provimento. 1 - Nota Promissória que contém 2 datas de vencimento, na forma disposta pelos arts. 33 e 77 do Decreto nº 57.663/1966, disciplinador da Lei Uniforme de Genebra no Brasil, é nula e, bem assim, a execução que se intenta com base nela. 2 - Sentença acolhendo Exceção de Pré-Executividade que se avaliza ante o improvimento do Recurso do exequente (Juiz Francisco Kupidlowski)”.

O julgamento que determinou o prosseguimento da Execução foi por maioria, ficando vencido o Relator, e prevalecendo o seguinte entendimento (fls. 52-53):

“Com efeito, não há falar em inexistência de título executivo, porque, neste caso específico, em sintonia plena com a lei de regência, ‘art. 6º da Lei Uniforme’, é de prevalecer a data de vencimento lançada a título por extenso.

Nesse sentido, fez-se referência nos Autos a Acórdão desta 5ª Câmara Cível, no julgamento da Apelação Cível nº 334.846-7, da Comarca de Alfenas, sendo Relator o Em. Juiz Mariné da Cunha, retratando situação exatamente idêntica à deste julgamento.

Afastada, assim, a questão em torno da data de vencimento, persiste a integralidade do título executivo, sem qualquer mácula e, via de consequência, afastada a prejudicial de prescrição, na consideração de que entre o vencimento e o ajuizamento da execução não decorreu o prazo prescricional previsto para a espécie”.

Em face deste julgado, opôs a recorrente o Recurso de Embargos Infringentes, sob o fundamento de que deve prevalecer o voto minoritário, que manteve a sentença de 1º Grau; que é nulo o título de crédito em questão e que é errada a aplicação do art. 6º da Lei Uniforme, por referir-se este dispositivo à divergência na quantia a ser paga, e não na data de vencimento.

No julgamento dos Embargos Infringentes, o entendimento foi de que deve prevalecer o que está escrito por extenso, conforme verificado a fls. 97-98:

“Ora, havendo no título executivo 2 datas, deve-se, por analogia, aplicar-se o art. 6º da Lei Uniforme, prevalecendo a data escrita por extenso.

Esse é o posicionamento que melhor se adequa ao espírito da lei, uma vez que não se deve desconstituir uma nota promissória devidamente assinada apenas por existir divergência na data de seu vencimento (fls. 97).

(...)

Empresto minha adesão ao entendimento prevalente, pois a norma legal de regência confere mandato ao portador da cambial, para preenchimento de seus claros, admitindo a possibilidade de eventuais divergências entre as informações constantes nos diversos campos do documento, caso em que deverá prevalecer a data grafada por extenso” (fls. 98).

O presente Recurso Especial foi interposto pela alínea a do inciso III do art. 105 da CF, no qual se alega violação aos arts. 6º, 33 e 77 da Lei Uniforme de Genebra, 55 do Decreto nº 2.044/1908 e 126 do CPC, sob o fundamento de ser nula a Nota Promissória emitida com 2 datas de vencimento distintas e de que não se trata de lacuna ou obscuridade na lei, pelo contrário, diz a recorrente ser clara a lei quanto a ser nulo o título com divergência de datas.

Contrarrazões a fls. 110, sob o fundamento de não estar prequestionado o Recurso e de que não houve ofensa a nenhum dispositivo de lei.

Decisão de admissibilidade, a fls. 117, determinando o prosseguimento do Apelo nobre a esta Corte.

É o relatório.

  VOTO

Exmo. Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): trata-se de Recurso Especial interposto pela alínea a do inciso III do art. 105 da CF, no qual se aponta negativa de vigência aos arts. 6º, 33 e 77 da Lei Uniforme de Genebra, 55 do Decreto nº 2.044/1908 e 126 do CPC, sob o fundamento de ser nula a Nota Promissória emitida com 2 datas de vencimento distintas; de que não se trata de lacuna ou obscuridade na lei (art. 126 do CPC), pelo contrário, diz a recorrente ser clara a lei quanto a ser nulo o título com divergência de datas; de que o art. 77 da Lei Uniforme diz respeito à divergência na quantia, e não na data de vencimento; de que o art. 33 da Lei Uniforme afirma claramente ser nula a letra que contiver divergência de vencimentos diferentes e, por fim, de que o art. 55 do Decreto nº 2.044/1908 também faz menção expressa a ser precisa e única a época do pagamento.

A sentença de 1º Grau, bem como o Voto minoritário do Tribunal local, entendeu ser imprestável o título pelo fato de constarem no mesmo 2 datas de vencimento diversas, indo em desacordo com o art. 55, parágrafo único, da Lei nº 2.044/1908.

Não há que se falar em ausência de prequestionamento, pois todos os dispositivos de lei apontados pela parte foram citados, de forma expressa, no Acórdão recorrido, como pode ser verificado a fls. 48 e 50, quando do julgamento da Apelação, e 94 e 96, no julgamento dos Embargos Infringentes.

Razão assiste à recorrente. Com efeito, o Acórdão recorrido está em total dissonância ao art. 55, parágrafo único, da Lei nº 2.044/1908. Eis o teor do dispositivo legal:

“Art. 55 - A nota promissória pode ser passada:

I - à vista;

II - a dia certo;

III - a tempo certo da data.

Parágrafo único - A época do pagamento deve ser precisa e única para toda a soma devida”.

Por outro lado, não se trata o presente caso de aplicação do art. 126 do CPC, que trata da analogia, uma vez que esta somente deve ser utilizada quando existir lacuna na lei e, no presente caso, há legislação específica sobre o assunto.

Importante transcrever ainda trecho do Voto estadual, quando do julgamento da Apelação, a fls. 50-51:

“Isto, desde logo, contraria o disposto no art. 55, parágrafo único, da Lei nº 2.044/1908, que prevê obrigatoriedade de época de pagamento precisa e única.

Do mesmo modo, o Decreto nº 57.663/1966, disciplinador da Lei Uniforme de Genebra, a que o Brasil veio a aderir, em seu art. 77, diz que às notas promissórias, no que couberem e não descartadas por artigo especial quanto a elas, aplicam-se as disposições atinentes às ‘letras de câmbio’, e, quanto a estas, o art. 33:

‘... As letras, quer com vencimentos diferentes, quer com vencimentos sucessivos, são nulas’”.

Nesse diapasão, prosperam as alegações da parte.

Ante o exposto, conheço do Recurso Especial e dou-lhe provimento para declarar nulo o título de crédito executado, por conter divergência na data de vencimento. Custas e honorários advocatícios por parte do recorrido, exequente, conforme fixados na sentença de 1º Grau, ficando, no entanto, suspensos em face da Justiça Gratuita.

É como voto.

 

 

   
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